segunda-feira, 16 de novembro de 2009

(Sem Nomenclatura)

Noite escura. Como de costume todas as noites são escuras. Mas essa tem uma escuridão diferente, uma escuridão gelada. Negra. Solitária no seu maior sentido pejorativo.
Foi nessa típica noite de "inverno-depressivo" que ela chorou.
O choro seco lhe feria a alma. O grito se fez surdo ficando engasgado na garganta.
Ela só queria poder falar com alguém que a ouvisse e desse um abraço forte e verdadeiro.
Que a colocasse no colo e fizesse carinho na sua nuca.
As pessoas costumam dizer que todos somos iguais.
Discordo.
Ela era diferente. Nunca conseguiu olhar muito tempo nos olhos de outras pessoas. Não acreditava nessa história de que "os olhos são o espelho da alma".
Mostrava nos olhos somente o que queria, aquela sensação de olhar fixo incomodava.
Achava estranho quando pessoas sentiam orgulho em dizer que as suas vidas eram um "livro aberto".
A dela era um livro fechado, bem fechado por sinal. Ninguém necessita saber de tudo da vida dos outros. Tinha verdades e segredos que só à ela pertenciam.
Tomavam café quente, ela gostava dele frio.
Dormiam a noite, ela lia e escrevia nas madrugadas.
Um "belo dia" ela encontrou um rapaz e o achou encantador. Não foi "amor à primeira vista" porque ela não acreditava nisso. Acreditava que "a primeira vista" pode se gostar da beleza, do cheiro, da energia etc. Mas amar não.
Amar é muito para se conseguir em meros olhares que são capazes de mentir e dissimular.
Pois então, ela o achou bonito, simpático e todo aquele blá blá blá.
Eles estavam em um Café.
Ele sorriu para ela, e ela sem graça derrubou o café na mesa. (clichê não?!)
Ele fixou o olhar nela por minutos que pareceram anos, depois levantou e perguntou se podia sentar.
Ela afirmou com a cabeça.
Ele era assim: um "tipão sem vergonha", simpático e falador.
Eles conversaram e sorriram e beberam café e trocaram telefones e se beijaram.
Tudo muito rápido.
Ela achou muito estranho. Mas gostou do inesperado encontro com o "desconhecido-simpático".
Eles se viam com frequência. Saiam, se divertiam juntos como duas crianças. Ele era mesmo uma pessoa encantadora...
Ela começou a ficar confusa.
Gostava de estar com ele, mas não sabia que nomenclatura usar para definir o que tinham. E era deveras um incômodo não saber a nomenclatura das coisas. Ter que chamar de "coisa" era frustrante.
O primeiro encontro no Café foi há três meses.
Ela pensava que antes que eles se assumissem como companheiros, ambos deveriam ter a certeza de que se amavam.
Não sabia se o amava.
Ela não sentia as tais "borboletas no estômago", ela não roía as unhas com ansiedade para vê-lo, eles não brigavam e ela não sofria por ele!
O fato de não sofrer era inquestionável!
Para que amasse ela tinha de sofrer. Precisava dormir chorando e acordar com os olhos inchados e o nariz entupido. Sem choro não existe amor!
Com ele não existia choro, nem brigas, sequer conflito de nenhuma espécie.
Ela concluiu: não o amava!
Mas gostava de estar com ele. E assim eles continuaram "estando".
E ela inconscientemente mudando com ele, e ele inconscientemente esfriando com ela.
Parecia que a muralha da China crescia entre os dois. Era congelante.
Ela começou a sofrer.
Não gostava das mudanças dele. O "desconhecido-simpático" se transformava em um "íntimo-muito-distante".
O coitado nem percebia, enquanto ela, tentava se aproximar. Colocou toda aparelhagem e começou a escalada pela muralha. Se empenhou em uma busca incessante pelo resgate do carinho que ele um dia à ofereceu.
Se esforçava em vão.
O sofrimento aumentava.
Sentia como se o coração fosse parar de bater a qualquer momento. O ar parecia faltar.
Maior é a dor da culpa, é saber que "temos o que plantamos". Chorava por saber que somente à ela pertencia a culpa sobre o acontecido.
Queria conseguir falar e poder dizer tudo que estava preso, queria que ELE, somente ele, a ouvisse e depois desse um abraço forte e verdadeiro sem dizer palavra.
Que a colocasse no colo e fizesse carinho na sua nuca.
...Só ele.
Ela não irá mais se divertir com os sorrisos fáceis dele, não mais vai se irritar com as frases clichês que chegavam no celular, nem receberá as flores que ela ignorava...
E a história dos dois terminará sem nomenclatura.
Hoje, ela percebeu que a noite estava escura. Como de costume todas as noites são escuras. Mas essa tem uma escuridão diferente, uma escuridão gelada. Negra. Solitária no seu maior sentido pejorativo.